Title: O GIGANTE EGO
1O GIGANTE EGOÍSTA
- Autor Oscar Wilde
- Nacionalidade Irlandesa
2- Todas as tardes, quando vinham da escola, as
crianças estavam acostumadas a ir brincar para o
jardim do gigante.
3- Era um jardim muito grande e bonito, todo
atapetado de macia e verde relva. Aqui e ali
havia lindas flores, que eram como estrelas entre
a relva, e havia uma dúzia de pessegueiros que,
ao chegar a Primavera, cobriam-se de delicadas
flores de rosa-pérola e, no Outono, davam
deliciosos frutos.
4As aves pousavam nas árvores e cantavam tão
suavemente que as crianças interrompiam as suas
brincadeiras para as ouvir. - Que bem se está
aqui! - diziam uns aos outros.
5- Um dia o gigante regressou. Tinha ido visitar o
seu amigo, o Ogre da Cornualha, e ficara com ele
durante sete anos. Ao fim deste tempo, havia dito
tudo o que tinha para dizer, pois era um homem
que falava pouco e decidiu regressar ao seu
castelo. Ao chegar, viu as crianças a brincar no
jardim.
6- - Que fazeis aqui? - gritou-lhes com voz
carrancuda e as crianças fugiram.
7- - O jardim é meu - disse o gigante -, toda a
gente pode compreender isto e não permitirei que
ninguém venha aqui brincar, a não ser eu. - Então construiu um alto muro ao redor do jardim e
pôs o seguinte cartaz
É proibida a entrada. Os transgressores Serão
castigados.
Era um gigante muito egoísta. As pobres crianças
não tinham, então, onde brincar. Tentaram
brincar na estrada, mas a estrada estava cheia de
poeira e de pedras pontiagudas e não gostaram.
Costumaram vaguear à roda do alto muro, depois
das aulas, e falar sobre o lindo jardim que havia
do outro lado.
8- - Que felizes éramos lá dentro! - diziam uns aos
outros. - Então chegou a Primavera e o país todo encheu-se
de flores e passarinhos. Só no jardim do gigante
egoísta era ainda Inverno. Os pássaros não
queriam ir lá cantar, porque não havia crianças e
as árvores esqueceram-se de florescer.
9- Um dia uma linda flor levantou a cabeça sobre a
relva, mas quando viu o cartaz teve tanta pena
das crianças, que se sumiu de novo na terra e
adormeceu. - Os únicos satisfeitos eram a Neve e a Geada.
10- - A Primavera esqueceu-se deste jardim - diziam.
-Poderemos viver aqui durante o ano todo. - A Neve cobriu a relva toda com seu manto branco e
a Geada pintou de prata todas as árvores. - Então convidaram o Vento do Norte para passar uma
temporada com eles, e o Vento aceitou. - Chegou coberto de peles e rugia o dia todo pelo
jardim, derrubando as chaminés.
11- - Este é um lugar adorável dizia ele. -Temos de
convidar também o Granizo. - E chegou o Granizo. Todos os dias durante três
horas, rufava no telhado do castelo, até quebrou
a maioria das telhas e então pôs-se a dar voltas
ao redor do jardim correndo o mais depressa que
podia. Ia vestido de cinzento e seu hálito era
frio como o gelo.
12- - Não posso compreender como a Primavera demora
tanto para chegar - dizia o Gigante Egoísta
quando se sentava à janela e olhava para o jardim
coberto de neve. - Espero que este tempo melhore!
- Mas a Primavera e o Verão nunca mais chegaram. O
Outono deu frutos dourados a todos os jardins,
mas ao jardim do gigante não deu nenhum. - - Ele é muito egoísta dizia.
- E assim era sempre Inverno na casa do Gigante e
o Vento do Norte, a Geada, o Granizo e a Neve
dançavam por entre as árvores.
13- Uma bela manhã, estava o Gigante ainda deitado,
mas já acordado, quando ouviu uma música muito
suave. Soava tão docemente aos seus ouvidos que
ele pensou que seriam os músicos do rei que
passava por ali. Na realidade era só um
Pintassilgo que cantava diante da sua janela, mas
há tanto tempo que ele não ouvia um pássaro
cantar no seu jardim, que lhe pareceu a música
mais bonita do mundo.
14- Então o Granizo deixou de dançar sobre a sua
cabeça, o Vento do Norte deixou de rugir, e um
delicado perfume chegou até ele, através da
janela aberta. - - Acho que, finalmente, chegou a Primavera -
disse o gigante e saltando da cama olhou para
fora. Que viu ele?
15- Viu um espectáculo maravilhoso. Por um buraco
pequenino do muro, as crianças tinham entrado no
jardim, tinham subido às árvores e estavam
sentadas nos seus galhos. Em todas as árvores
havia uma criança. E as árvores ficaram tão
felizes de tornar a ter as crianças consigo, que
se cobriram de flores e agitavam suavemente os
seus ramos sobre a cabeça das crianças. - Os pássaros voavam e chilreavam alegremente e as
flores espreitavam por entre a relva e riam.
16- Era uma cena encantadora. Só num cantinho
continuava a ser Inverno. Era o cantinho mais
afastado do jardim e ali encontrava-se um menino
muito pequeno. Tão pequeno que não podia alcançar
os ramos da árvore, e dava voltas à sua volta
chorando desconsolado. A pobre árvore continuava
ainda coberta de Neve e Geada e o Vento do Norte
soprava e rugia à sua volta.
17- -Sobe, pequeno! - disse-lhe a árvore baixando os
ramos o mais que podia mas o menino era
demasiado pequeno. - O coração do gigante enterneceu-se ao ver aquela
cena. - - Como tenho sido egoísta! - disse ele. -Agora
compreendo porque a Primavera não queria vir para
aqui. Vou colocar o menino em cima da árvore,
derrubarei o muro e meu jardim será para todo o
sempre o recreio das crianças.
18- Estava verdadeiramente arrependido pelo que tinha
feito. - Lançou-se escadas a baixo, abriu a porta
principal da casa com toda suavidade e saiu para
o jardim. - Mas as crianças ficaram tão assustadas quando o
viram que fugiram cheias de medo e Inverno voltou
ao jardim.
19- Só o menino não fugiu, pois os seus olhos estavam
tão cheios de lágrimas, que não viu chegar o
Gigante. E o Gigante aproximando-se
cautelosamente, pegou-lhe com todo o carinho e
colocou-o sobre a árvore.
20- E árvore floresceu imediatamente, os pássaros
aproximaram-se e o menino estendeu os bracinhos,
abraçou o Gigante e beijou-o. - Quando as outras crianças viram que o gigante já
não era mau, voltaram a correr e a Primavera
voltou.
21- - De agora em diante, este jardim é vosso, minhas
queridas crianças - disse o Gigante, e pegando
uma grande picareta derrubou o muro. E quando ao
meio-dia passaram por ali pessoas que iam ao
mercado, encontraram o gigante a brincar com as
crianças no mais belo jardim que jamais tinham
visto. - Durante todo o dia estiveram a brincar e ao
entardecer foram ter com o Gigante para lhe dizer
adeus.
22- - Mas onde está o vosso colega? Aquele que eu pus
em cima da árvore? - perguntou. - Esta era a criança que o gigante mais gostava
porque o tinha beijado. - - Não sabemos - responderam as crianças - foi-se
embora. - - Digam-lhe que venha amanhã sem falta -
disse-lhes o gigante . - Mas as crianças disseram que não sabiam onde ele
morava e que nunca o tinham visto antes. O
gigante ficou muito triste. - Todas as tardes, quando terminavam as aulas, as
crianças iam brincar com o gigante. Mas o menino,
de que o Gigante tanto gostava, nunca mais
apareceu. O Gigante era muito bondoso com todas
as crianças mas sentia saudade daquele seu
primeiro amiguinho e muitas vezes falava nele.
23- - Como eu gostaria de o ver - costumava dizer.
- Passaram muitos anos e o Gigante envelheceu muito
e cada vez estava mais fraco. Como já não podia
participar nas brincadeiras, sentava-se numa
grande cadeira de braços, a ver brincar as
crianças e admirar o seu jardim. - -Tenho muitas flores bonitas - dizia - mas as
crianças são as flores mais belas.
24- Uma manhã de inverno olhou pela janela, enquanto
se vestia. Já não detestava o Inverno, pois sabia
que o Inverno era a Primavera adormecida e que as
flores descansavam. - De repente esfregou os olhos, espantado, e olhou
e tornou a olhar. Verdadeiramente tratava-se de
uma visão maravilhosa. No cantinho mais afastado
do jardim havia uma árvore totalmente coberta de
lindas flores brancas. Os seus ramos eram
dourados, frutos de prata penduravam-se deles e
debaixo, de pé, estava o menino de que ele tanto
gostava.
25- O gigante desceu apressado as escadas e, com
grande alegria, saiu para o jardim. Correu
depressa pela relva e chegou perto do menino.
Quando estava perto dele, o seu rosto ficou
vermelho de raiva e exclamou - - Quem se atreveu a ferir-te? -Pois nas palmas
das mãos do menino havia a marca de dois pregos,
e a mesma coisa acontecia nos seus pezinhos. - - Quem se atreveu a ferir-te? - gritou o gigante
- Diz-me quem foi para que eu pegue na minha
espada e o mate.
26- - Não - respondeu o menino. Estas são feridas do
Amor. - - Quem és tu? - perguntou o Gigante e começou a
sentir um estranho temor pelo corpo todo e ele
ajoelhou diante do menino. - E o menino, sorrindo ao Gigante, disse-lhe
- - Tu deixaste-me brincar uma vez no teu jardim
hoje virás comigo para o meu jardim, que é o
Paraíso.
27- E, quando chegaram as crianças nessa tarde,
encontraram o Gigante deitado, morto, debaixo da
árvore, todo coberto de flores brancas.
FIM